Longe do abrigo
Registered by Patiblue on 5/30/2006
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LONGE DO ABRIGO, a mais recente obra de David Lodge publicada em Portugal, afasta-se do costumeiro território do romance académico para lidar com os traumas da Segunda Guerra Mundial num jovem londrino.
LONGE DO ABRIGO é um romance atípico dentro do universo lodgiano. Por isso, é importante ter presente que este livro é um dos primeiros romances do escritor inglês, escrito de facto em 1970, embora só agora seja traduzido para português.
De um ponto de vista cronológico, David Lodge é até um escritor muito coerente nos temas que aborda: desde a primeira obra, The Picturegoers (1960) que o vemos obcecado com temas universitários, a opressão de uma educação católica e a descoberta da sexualidade, reprimida ou desenfreada. E é sobretudo por quebrar esta predominância temática que LONGE DO ABRIGO ocupa um lugar de destaque na produção literária deste brilhante professor de teoria literária.
Embora a sexualidade desempenhe um papel determinante no desenvolvimento do jovem Timothy, ela é neste livro apenas mais uma etapa na descoberta de um mundo para lá da depressão pós-guerra que marca adolescência de um típico adolescente em Londres nos longínquos anos 50.
Sobrevivendo aos traumas do blitz , mas mantendo dele e das privações da guerra uma memória bastante nítida, Timothy é convidado pela irmã Kath a conhecer a vida de bem-estar material e relativa liberdade que lhe proporciona um emprego junto das forças de ocupação americana na Alemanha nos anos imediatamente a seguir à guerra. Kath é também uma mulher rara na galeria de personagens femininas de David Logde: num acto de coragem e ousadia que não teve de esperar por um casamento monótono e meia dúzia de filhos para se tornar urgente, esta jovem aparentemente sem grandes ambições ou atractivos parte para os EUA enquanto a guerra dizima a Europa, para aceitar um emprego no exército americano que lhe permite ultrapassar esta época de depressão numa diáspora de relativo desafogo material. O requinte e luxo que ostenta nas raras visitas a casa levantam suspeitas junto da família e da claustrofóbica sociedade londrina, pelo que cabe a Timothy deixar para trás o universo restrito em que sempre decorreu a sua vida e ir ter com a irmã à Alemanha.
Esta viagem é, obviamente, o grande passo no crescimento do rapaz. Confrontado desde a chegada com um ambiente de luxo e grande agitação social, cultural e sexual, Timothy embarca com alegria nas novas descobertas. O choque cultural é tratado com alguma simplicidade – estamos ainda longe da mestria de contrastes de obras como Um almoço nunca é de Graça , mas também num tom de mistério e sinceridade que não mais se repetirão na obra de Lodge.
Uma interessante, se bem que muito tímida, imersão nos meandros da intriga política, e até da política sexual, transporta-nos num ritmo de ansiedade a que o desfecho responde com uma de certa forma decepcionante dose de existencialismo. Lodge começou desde cedo a revelar um engenho notável para traduzir na ficção as correntes filosóficas e literárias em que decorre a sua vida académica...
Com tudo o que fica por dizer, o epílogo deixa a porta aberta para as restantes obras de David Logde. Mas LONGE DO ABRIGO deixa-nos também um amargo de boca, sobretudo pelo destino de Kath, também ela abrigo e refúgio ( shelter em inglês), mas não para si própria. Este romance invulgarmente humano, ainda que desajeitado e incipiente, é porventura a mais sóbria reflexão de Lodge sobre a insuficiência da protecção e expectativas que a sociedade oferece às mulheres, desde a mais tenra idade. Sair do abrigo com a toda uma vida para construir é, afinal, um privilégio que nem a guerra rouba aos homens...
LONGE DO ABRIGO é um romance atípico dentro do universo lodgiano. Por isso, é importante ter presente que este livro é um dos primeiros romances do escritor inglês, escrito de facto em 1970, embora só agora seja traduzido para português.
De um ponto de vista cronológico, David Lodge é até um escritor muito coerente nos temas que aborda: desde a primeira obra, The Picturegoers (1960) que o vemos obcecado com temas universitários, a opressão de uma educação católica e a descoberta da sexualidade, reprimida ou desenfreada. E é sobretudo por quebrar esta predominância temática que LONGE DO ABRIGO ocupa um lugar de destaque na produção literária deste brilhante professor de teoria literária.
Embora a sexualidade desempenhe um papel determinante no desenvolvimento do jovem Timothy, ela é neste livro apenas mais uma etapa na descoberta de um mundo para lá da depressão pós-guerra que marca adolescência de um típico adolescente em Londres nos longínquos anos 50.
Sobrevivendo aos traumas do blitz , mas mantendo dele e das privações da guerra uma memória bastante nítida, Timothy é convidado pela irmã Kath a conhecer a vida de bem-estar material e relativa liberdade que lhe proporciona um emprego junto das forças de ocupação americana na Alemanha nos anos imediatamente a seguir à guerra. Kath é também uma mulher rara na galeria de personagens femininas de David Logde: num acto de coragem e ousadia que não teve de esperar por um casamento monótono e meia dúzia de filhos para se tornar urgente, esta jovem aparentemente sem grandes ambições ou atractivos parte para os EUA enquanto a guerra dizima a Europa, para aceitar um emprego no exército americano que lhe permite ultrapassar esta época de depressão numa diáspora de relativo desafogo material. O requinte e luxo que ostenta nas raras visitas a casa levantam suspeitas junto da família e da claustrofóbica sociedade londrina, pelo que cabe a Timothy deixar para trás o universo restrito em que sempre decorreu a sua vida e ir ter com a irmã à Alemanha.
Esta viagem é, obviamente, o grande passo no crescimento do rapaz. Confrontado desde a chegada com um ambiente de luxo e grande agitação social, cultural e sexual, Timothy embarca com alegria nas novas descobertas. O choque cultural é tratado com alguma simplicidade – estamos ainda longe da mestria de contrastes de obras como Um almoço nunca é de Graça , mas também num tom de mistério e sinceridade que não mais se repetirão na obra de Lodge.
Uma interessante, se bem que muito tímida, imersão nos meandros da intriga política, e até da política sexual, transporta-nos num ritmo de ansiedade a que o desfecho responde com uma de certa forma decepcionante dose de existencialismo. Lodge começou desde cedo a revelar um engenho notável para traduzir na ficção as correntes filosóficas e literárias em que decorre a sua vida académica...
Com tudo o que fica por dizer, o epílogo deixa a porta aberta para as restantes obras de David Logde. Mas LONGE DO ABRIGO deixa-nos também um amargo de boca, sobretudo pelo destino de Kath, também ela abrigo e refúgio ( shelter em inglês), mas não para si própria. Este romance invulgarmente humano, ainda que desajeitado e incipiente, é porventura a mais sóbria reflexão de Lodge sobre a insuficiência da protecção e expectativas que a sociedade oferece às mulheres, desde a mais tenra idade. Sair do abrigo com a toda uma vida para construir é, afinal, um privilégio que nem a guerra rouba aos homens...
