Um homem pode ser estrangeiro na sua própria terra. Pode ser estrangeiro na sua própria casa. Ou dentro de si. Basta-lhe, para isso, que um dia, ao acordar, não compreenda o sentido das coisas. O herói deste apaixonante romance descobre-se, numa manhã soalheira de Argel, um estrangeiro dentro de si próprio. Estrangeiro, indiferente, incapaz de amar e, talvez até, de sofrer. Ao fim e ao cabo, porque nada lhe parece valer a pena, valer o sacrifício do esforço de viver.

Eis o triunfo do Absurdo - ou a luta com o Absurdo? -, tal qual no-lo descreve Camus, malogrado escritor que foi, na companhia de Sartre e outros, uma das figuras cimeiras do Existencialismo, nos anos do pós-2ª Guerra Mundial, quando a Europa e o Mundo buscavam novos caminhos. Em duas centenas de páginas, repensam-se, implacavelmente, os valores a que sempre nos agarrámos...

Andava para ler este livro há imenso tempo... Agora com o Desafio do Alfabeto de Autores decidi-me a pegar nele. Simplesmente genial. A princípio estava a estranhar a maneira de escrever de Camus, uma forma algo curiosa: quase que parece que está a escrever um telegrama. A própria personagem de Mersault deixa-nos um tanto ou quanto revoltados pela sua maneira de ser absorta, indiferente, soturna. Quase como se andasse pela vida sem nada esperar dela. Infelizmente, revi-me totalmente nesta personagem que responde com um encolher de ombros a todas as perguntas que lhe fazem.

A narração crua na primeira pessoa e o realismo do que é descrito da forma mais despretensiosa e simples são sem dúvida, a meu ver, factores a favor do livro. Os longos discursos indirectos por vezes são algo confusos, mas servem tão bem a história que nem isso posso apontar como grande defeito.

Um livro de que gostei bastante, não sei bem explicar porquê... Talvez por tudo o que disse acima ou talvez por nada mais do que o facto de ser uma história bem escrita que, embora algo objectiva demais, não deixa de nos tocar pela sua simplicidade complexa.


C no Desafio do Alfabeto de Autores

Enviado hoje para o b3lo, que o aceitou no BookRelay. Espero que goste!

A edição não é das melhores, como escreves, mas tem uma introdução bem esclarecedora(que não existia na edição do Estrangeiro que li) e tem uma bela citação que vou usar num trabalho que estou a fazer sobre o silêncio. Por isso valeu! Obrigado JP!