Port-Soudan
1 journaler for this copy...
“Foi em Porto-Sudão que tomei conhecimento da morte de A.” O narrador decide então regressar a Paris e procurar compreender as circunstâncias dessa morte, uma espécie de suicídio lento, precedido por uma história de amor infeliz. Pouco a pouco, as peças do xadrez definem-se, e o narrador reconstrói a sucessão de jogadas que levaram ao mate. No começo, havia A., o amigo escritor, marginal num mundo vulgar e conformista, e ela, a jovem mulher, misteriosa, silenciosa e reservada. Depois percebe-se que um dia ela desapareceu, deixando A. à deriva num apartamento vazio, só com as recordações e a “marca de um corpo longamente adorado”. Não restam senão as imensas noites alcoolizadas, os antidepressores, a deriva do corpo e do espírito e, no fim do caminho, o hospital e o suicídio. É então que as distâncias se desvanecem, que Porto-Sudão e Paris, cidades de todos os naufrágios, se transformam numa única cidade, que o narrador e A. se confundem numa única desesperança. Raramente a ausência e o abandono, que “fere mais que a morte”, terão sido escritos com tal força.
“...A beleza deste magnífico livro de Olivier Rolin vem precisamente da energia da indignação, da força contagiante de uma escrita que é toda ela feita de uma visceral recusa de as coisas estarem a ser o que são. E a própria história de amor não é apenas a de uma mulher que um dia pega na roupa e nos sapatos de ténis e parte, é também a suspeita mais terrível de que afinal ela, com quem A. viveu alguns tempos maravilhosos, ou aparentemente maravilhosos, mas onde está a diferença?, ela desde sempre o começara a trair, não por amar um outro, que importância tem isso?..., mas por desde sempre fazer parte, ser cúmplice, conivente, com esse mundo de indiferença generalizada que A. detesta.” – Eduardo Prado Coelho
“...A beleza deste magnífico livro de Olivier Rolin vem precisamente da energia da indignação, da força contagiante de uma escrita que é toda ela feita de uma visceral recusa de as coisas estarem a ser o que são. E a própria história de amor não é apenas a de uma mulher que um dia pega na roupa e nos sapatos de ténis e parte, é também a suspeita mais terrível de que afinal ela, com quem A. viveu alguns tempos maravilhosos, ou aparentemente maravilhosos, mas onde está a diferença?, ela desde sempre o começara a trair, não por amar um outro, que importância tem isso?..., mas por desde sempre fazer parte, ser cúmplice, conivente, com esse mundo de indiferença generalizada que A. detesta.” – Eduardo Prado Coelho
Um livro fantástico, muito bonito, muito bem escrito, muito... muito!
Só de pensar que peguei nele como que por acaso... Às vezes temos estas surpresas, quando menos o esperamos.
Apetecia-me transcrever aqui metade do livro, tantas e tão lindas passagens tem. Assim, vou ver se consigo seleccionar uma ou outra, das que mais gostei para tentar mostrar um pouco do que estou a falar.
Só de pensar que peguei nele como que por acaso... Às vezes temos estas surpresas, quando menos o esperamos.
Apetecia-me transcrever aqui metade do livro, tantas e tão lindas passagens tem. Assim, vou ver se consigo seleccionar uma ou outra, das que mais gostei para tentar mostrar um pouco do que estou a falar.
Por exemplo (a falar sobre Literatura):
"Parecia-me por vezes que os homens eram como grandes estátuas vazias e no interior escuro das quais bramia um fragor desmedido, distorcido pela mutiplicação desordenada dos ecos: e escrever seria então tentar orquestrar esse puro rumor do caos. Abrigávamos, sob a magestade muda do céu, estas ressonâncias de cisternas, esses mugidos de oceano nas grutas, de animais degolados em subterrâneos. Isto tinha que ver com a demência e a morte, ou então, se quisermos, com a razão e a vida consideradas como a luta confusa e perdida de antemão que travamos contra esses poderes aniquiladores, o adiamento do momento em que eles viriam fazer-nos calar. Escrever teria sido compor música entre a desordem e o silêncio eterno."
"Parecia-me por vezes que os homens eram como grandes estátuas vazias e no interior escuro das quais bramia um fragor desmedido, distorcido pela mutiplicação desordenada dos ecos: e escrever seria então tentar orquestrar esse puro rumor do caos. Abrigávamos, sob a magestade muda do céu, estas ressonâncias de cisternas, esses mugidos de oceano nas grutas, de animais degolados em subterrâneos. Isto tinha que ver com a demência e a morte, ou então, se quisermos, com a razão e a vida consideradas como a luta confusa e perdida de antemão que travamos contra esses poderes aniquiladores, o adiamento do momento em que eles viriam fazer-nos calar. Escrever teria sido compor música entre a desordem e o silêncio eterno."