Anos atrás, o narrador (o autor) deparou-se com um anúncio publicado no Paris-Soir de 31 de Dezembro de 1941: “Procura-se uma rapariga de 15 anos, Dora Bruder..." Quem era Dora Bruder? Desde esse dia, o destino da jovem judia enredada nas malhas da ocupação alemã nunca mais o largou, obcecado como estava em reconstruir a sua história até aos momentos finais no campo de Auschwitz.
Este livro (como, aliás, toda a obra de Modiano) é assim um combate contra o esquecimento, uma afirmação portentosa dos caminhos redemptores da memória — contra tudo aquilo que nos macula e destrói.
Com ele, Modiano escreveu uma das obras mais notáveis da moderna lietratura francesa e confirmou-se como um dos grandes escritores contemporâneos.

Podia separar a leitura deste livro em duas fases distintas - antes e depois de me aperceber tratar-se de um relato verídico.

Dora Bruder começou por ser uma personagem, uma criação algo abstrata uma vez que nem sequer o narrador nos podia contar sobre ela mais do que o anúncio que lera avançava. O próprio narrador foi, durante muitas páginas, uma personagem do livro, mergulhada nas suas múltiplas hipóteses acerca de Dora.

A dada altura, um súbito aperto no peito fez-me ponderar a possibilidade da existência real de Dora e da vontade humana de um desconhecido lhe seguir o rasto, impedindo-a de ser mais uma perda anónima no meio de tantas outras, conferindo-lhe a dignidade que lhe fora roubada.

A partir desse momento, Dora, a sua família e o próprio narrador recuperaram a sua dimensão humana e os vértices aguçados desta história triste começaram a ferir-me, fazendo-me regressar às visitas a Auschwitz e a Birkenau, que tanto me marcaram. e, de repente, dou-me conta de que também a minha vida pode ser separada em duas fases distintas: o antes e o depois dessa viagem à Polónia.

Mais um livro sobre a II Guerra Mundial que vale a pena ler. Porque conhecer este pedaço de História é o maior passo para que ela não se repita.